A inteligência artificial também já sabe dialogar!
A Inteligência Artificial, como todas as tecnologias, tem enorme potencial, quer para melhorar a vida das pessoas, quer para criar novos e complicados problemas. Nos últimos anos tem sido desenvolvido pela OpenAI um chatbot que levou este potencial ao centro da tensão e veio surpreender o mundo. Esta ferramenta tecnológica chama-se ChatGPT e foi lançada em 30 de novembro de 2022. O ChatGPT é capaz de resumir qualquer texto, desenvolver qualquer tema que lhe seja apresentado ou responder a qualquer pergunta em mais de 80 idiomas. O que é ainda mais surpreendente é que se lhe fornecermos um título consegue criar de raiz uma poesia.
A capacidade de criar texto através da informação que lhe é dada pelo utilizador e aquela com que foi criada vinda da internet faz com que muitas tarefas se tornem triviais. Estes trabalhos não podem ser, no entanto, aceites sem algum tipo de intervenção e verificação humana porque estas ferramentas não conseguem diferenciar o facto da ficção, só tentam escrever algo que "soe correto" tendo em conta o material com que foi originalmente criado. Isto leva a que seja capaz de produzir mentiras com aspeto extremamente genuíno. Estas "alucinações", como são conhecidas, são especialmente perigosas por serem tão convincentes e subtis.
Tem-se feito muito investimento para reduzir a frequência destas "alucinações", mas por mais melhorias e avanços que sejam feitos nesta tecnologia é crucial que qualquer informação ou texto vindo do ChatGPT seja tratada sempre como um esboço inicial, não como uma solução completa.
O NotebookLM é uma aplicação desenvolvida pela Google com o objetivo de processar texto proveniente de documentos, sites ou até mesmo vídeos do Youtube (desde que legendados) e, através do uso de inteligência artificial, produzir resumos dos conteúdos. Fornece também uma funcionalidade experimental que consiste na produção de diálogos falados em formato "podcast" sobre o tema a que se refere o texto.
Apresentei ao o artigo referente ao poeta popular António Aleixo escrito em português e esta inteligência artificial fez um resumo do texto e criou um áudio, como que um podcast sob a forma de uma conversa em inglês entre dois "comentadores" a que eu dei os nomes fictícios de Mary e John.
O resumo é o seguinte texto:
O texto apresenta um blogue dedicado a António Aleixo, poeta popular português conhecido pelas suas quadras improvisadas e pela crítica social contundente. O blogue explora a vida e obra do poeta, incluindo a sua infância pobre, as suas profissões e a sua visão da sociedade portuguesa. Através de excertos da sua poesia e de citações de António Aleixo, o blogue mostra o talento do poeta, a sua perspicácia social e a sua capacidade de usar a linguagem simples para transmitir mensagens profundas e relevantes.
Para ouvir o podcast clique no link seguinte:
https://notebooklm.google.com/
Aqui fica uma "tradução caseira" do diálogo que a inteligência artificial criou em torno do que estava escrito:
John- Sejam bem-vindos. Hoje encontrámos uma preciosidade:
Mary- o poeta português António Aleixo.
John- Você pode ainda não o conhecer mas temos o seu historial e alguns poemas. Vamos já abordar o que o motiva.
Mary- Ele é realmente uma personagem fascinante.
John- Pensamos que os poetas estão numa torre de marfim, no entanto a poesia de António Aleixo vem diretamente das ruas do início do século XX em Portugal
Mary- refletindo o dia-a-dia da vida das pessoas comuns.
John- Quase como se ele ultrapassasse ...
Mary- aquela imagem tradicional do poeta e atingisse o fulcro do que faz a poesia.
John- Ele nasceu em 1899 e não teve acesso a uma escola.
Mary- O pai ensinou-o a ler e a escrever. Não são as origens que esperaríamos de um poeta.
John- Nasceu em Vila Real de Santo António.
Mary- A sua sala se aula foi o próprio mundo e estas vivências são a chave para entender Aleixo.
John- Imagine um António Aleixo de dez anos que ia de porta em porta cantando as Janeiras, as canções portuguesas do Ano Novo.
Mary- Não apenas as cantava...
John- ele improvisava os versos no momento.
Mary- Espera lá, improvisava poesia em criança?
John- Isso é uma capacidade extraordinária de fazer rimas.
Mary- Ficamos a pensar no que fez despertar esse talento nele ...
John- Foi alguma coisa ligadas essa mesma tradição das Janeiras, de cantar esperanças para o ano novos muitas vezes com comentários.
Mary- Ele absorvia não só a música mas também essa mistura de otimismo e observações incisivas que se tornaram um clássico de Aleixo mais tarde. Começou precocemente a libertar essa sensibilidade. O seu talento não ficou escondido.
John- Soldado, polícia e vendedor de lotaria. Cada trabalho que ele fez foi um capítulo diferente da sua vida
Mary- cada um deles alimentava a sua poesia. Ele não observava a vida à distância.
John- Ele estava imerso nas suas difíceis e vibrantes realidades.
Mary- Cada profissão punha-o frente-a-frente com pessoas de todas as classes sociais
John- dando-lhe uma perspetiva extremamente rica.
Mary- Até escreveu, "Fui um polícia, fui um soldado. Estive longe da nação, vendo jogo, guardo gado. Só me falta ser ladrão."
John- Mostra autoconhecimento.
Mary- É como se ele tomasse consciência dessas preciosidades e absurdos da vida que podem levar as pessoas para diversos extremos.
John- Quase podemos ouvir as suas risadas enquanto diz isto.
Mary- Exatamente. E isso é importante.
John- Ele nunca se posiciona acima das pessoas de que fala.
Mary- Ele está no meio deles partilhando as suas lutas, o seu humor, a sua visão das coisas.
John- E são essas experiências partilhadas que tornam a sua "filosofia amarga" tão potente
Mary- Oh, absolutamente!
(...)
Mary- Não são só comentários divertidos, toca profundamente devido à rudeza da sua própria realidade.
(...)
Mary- Não são intelectualizações desconexas
John- nasce da raiva, da dor crónica
Mary- de ver em primeira mão as lutas dos que estão à sua volta. Há até uma poesia em que ele vê uma criança vestida de trapos brincando na rua que despoleta as suas próprias reflexões no seu percurso de vida.
(...)
John- Ele não está a pregar. Ele diz, eu estive lá, eu estou a ver-te e percebo o que sentes.
Mary- E o que é tão poderoso
John- é como ele transforma isso em comentário social. Não são só reflexões pessoais.
Mary- Ele tem um espelho frente à sociedade, dirigido em especial àqueles que estão no poder. Isto está visível no seu poema "Não dês esmolas a santinhos".
John- Ele foca a hipocrisia dentro da Igreja.
Mary- Esse poema é uma aula magna sobre sátira
John- Ele adopta a voz da própria Igreja
Mary- avisando as pessoas para não darem esmolas a esses santinhos
(...)
Mary- há que dá-las diretamente aos pobres
(...)
Mary- Depois ele descreve esses clérigos em banquetes com frango e tomates
John- enquanto os pobres vivem com fome
(...)
John- Põem as doações do dinheiro para velas
Mary- nos seus próprios bolsos
Mary- É brilhante a contradição desta dita piedade
John- com a realidade das suas ações.
(...)
Mary- Ele usa esta crítica mordaz nas suas quadras
(...)
Mary- Tudo isto ainda faz sentido tantas décadas mais tarde.
John- Há uma estátua dele em Loulé.
Mary- Verdade?
John- Um poeta popular imortalizado
Mary- Uau!
John- Consegue-se este tipo de reconhecimento....esta estátua até parece simbólica, uma prova de que as palavras de Aleixo ultrapassavam as barreiras das convenções
Mary- e chegaram diretamente ao povo
Mary- O que é que há nas suas palavras que tem tanto impacto fizeram passar a barreira do tempo e que fazem sentido para pessoas que nunca viveram naquela altura
Mary- As suas palavras são tão frontais
John- o seu humor é surpreendente
Mary- Os alvos das suas críticas são universais, desgostos de amor, a luta diária de viver com pouco dinheiro, o sentimento de injustiça.
John- Isto são experiências sem limite, no tempo e no espaço.
Mary- Ele não fala de teorias académicas
John- Ele está connosco no comboio
Mary- E isso faz toda a diferença.
John- Ele brinca com as situações
Mary- É como se ele dissesse que mesmo quando a vida nos desafia é possível encontrar momentos de humor.
Mary- Ele desafia-nos a encontrar os laivos de luz na escuridão
John- de rir do absurdo daquilo tudo mesmo que estejamos a lutar por um mundo melhor.
Mary- Isso é incrivelmente moralizador.
(...)
Mary- Ele diz, repara, eu vejo a hipocrisia, eu apercebo-me dessas injustiças
John- mas eu recuso-me a deixar que isso me esmague.
John- E ao fazer isso ele dá-nos permissão de fazer o mesmo.
(...)
Mary- Ele faz-nos rir
John- Ele também nos faz pensar, porque é que isto é engraçado, Ele faz acordar o nosso próprio pensamento crítico
Mary- Ele é um poeta do povo em todos os sentidos
John- as suas alegrias, as suas lutas, a sua raiva justificada
Mary- tudo isso transparece no seu trabalho.
John- António Aleixo, o poeta que nos faz rir, que nos faz pensar
Mary- que quer desafiar o estado das coisas
John- tudo isso em quatro versos que rimam
Mary- Eu adoro isso
John- Isso é um incrível legado que ele nos deixou
Mary- um legado que nos lembra que a poesia é aquilo que nos liga uns aos outros,
John- é sobre o encontrar significado em experiências partilhadas e usar as nossas vozes para falar a verdade ao poder.
Mary- Esta foi a melhor nota para acabar este diálogo profundo.
John- Até à próxima. Continuem a explorar, continuem a questionar-se
Mary- e talvez experimentar fazer as vossas próprias quadras
John- Nunca se sabe que talentos escondidos vocês podem encontrar.
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E afinal o que temos aqui? Duas vozes discutindo, comentando algo que lhes foi apresentado por escrito. Vozes que não pertencem a pessoas reais, não são pessoas, são vozes que imitam surpreendentemente aquilo que os humanos dizem, as entoações, os tons de surpresa, as risadas. Além de ser surpreendente é fascinante e arrepiante ao mesmo tempo. Faz-nos pensar no que é possível fazer com inteligências artificiais e como pode toda esta tecnologia ser usada.
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